Embalado pela demente inconveniência, não me recordo de alguma vez ter sabido parar, submerso na febril hilaridade dos loucos a quem os sábios narcísicos epitetaram de génios. Porquê parar? Porquê a cura, a terapia e a imitação? Porquê a redenção, se assim me amo, e se assim sou amado, e se - apesar de não amar - nada me asseverar que, vulgar fosse, comum amaria?
Não páro porque não me vulgarizarão na simpatia ou sensatez - não serei o vaso encantado da minha rosa. Qualquer cena é obscena no espectáculo de horrores desse promíscuo folclore em que não alinho e cujo breve visionamento me metamorfizou num céptico, metaforicamente porventura o maior cliché de todos.
A normalidade é a ausência da alma. Essa rendição à convenção é o enterro do individualismo, padronização da virtude desavinda; e a similitude da espécie vaticina uma certa sensibilidade colectiva (o que significa sensibilidade alguma).
Cada homem morre quando deixa de ser criança, e os que não deixam são as temerárias formigas de rumo oposto ao carreiro de matilhas ordeiradas nos supermercados ou na consuetudinária fila do Lux - todos os corpos aspirando à irresolução de campas, caixões e mausoléus iguais, com relvas e flores indistintas...
Mas livres são as almas! E a sensibilidade é o velcro despreendido dos que nunca cresceram (ou não souberam parar). É nessa libertação estigmatizante dos sentidos que se percebe que quando todo o mundo é grosseiro e coxo, a elegância e o belo porte se tornam a Enfermidade. Quando o feio impera, o belo é Monstruoso.
'Sábio é quem monotoniza a existência, pois então cada pequeno incidente tem um privilégio de maravilha. O caçador de leões não tem aventura para além do terceiro leão. Para o meu cozinhiero monótono uma cena de bofetadas na rua tem sempre qualquer coisa de apocalipse modesto. Quem nunca saiu de Lisboa viaja no infinito no carro até Benfica, e, se um dia vai a Sintra, sente que viajou até Marte. O viajante que percorreu toda a terra não encontra de cinco mil milhas em diante novidade, a velhice do eterno novo, mas o conceito abstracto de novidade ficou no mar com a segunda delas.'
Fernando Pessoa, in "Livro do Desassossego"
5 comentários:
...ou na "consuetudinaria" fila DO BBC, ou na "consuetudinaria" fila da kapital...
a maior partida k o diabo nos prega é a de nos fazer akreditar k ele nunca existiu...
bem... que culta... uma citaçao... dum filme... de hollywood...
pelo menos Os suspeitos do costume é daqueles minimanente suportáveis, escapou à hamburguerização
f*s tu andaslhe a dar mesmo bueeeee!!....melhor texto de sempre????
Marry me!!!Marry me!!!
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